O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

sexta-feira, junho 11, 2004

AINDA O OFÍCIO DE VIVER E AMAR...

CESARE PAVESE:
A luta e a contradição do Homem sem a Mulher Amada

(...)
Porque é que quase toda a gente sofreu uma desilusão de amor? Porque o próprio amor, sobre o qual se lançaram com entusiasmo, devia traí-los – por causa da lei que diz que só se obtém o que se pede com indiferença.

Para obter um amor trágico é necessário hablilidade. Mas são precisamente os incapazes de habilidades que têm sede de amor trágico.

Um amor interessa à pessoa amada por causa das coisas que traz consigo. É por isso que quem tenta amar, sincera e integralmente, quase nunca teve tempo para acumular as coisas (personalidade, riquezas, força, meios, qualidade, etc.) que fariam aceitar o seu amor.

Quanto ao amor, ninguém sabe o que fazer dele. E sejamos justos: que coisa é o amor senão a líbido de um macaco?

Que nunca conseguiremos plantar-nos no mundo (um trabalho, uma normalidade), é evidente.
Que nunca conquistaremos uma mulher (nem um homem), é manifesto, tanto pela precedente fraqueza como por aquela que sabes.
(...)

Para que serviu um grande amor?
Para descobrir todas as minhas taras, para pôr à prova a minha têmpera, para que eu pudesse julgar-me. (...)

Nada me salvou. (...)

Cheguei ao ponto de esperar salvação do exterior, e não existe cegueira maior: penso ainda que , com ela, poderia viver e lutar. Mas ela encarregou-se de justificar esta ilusão: riu-se-me na cara e poupou-me, assim esta ultima e penosa experiência.

“...Estamos cheios de vícios e tiques e de horrores. Nós os homens, os pais...”


O SUICÍDIO:
"Basta um pouco de coragem.

Quanto mais a dor é determinada e precisa, mais o instinto da vida se debate, e cede a idéia do suicídio.

Parecia fácil, pensando nisso. Entretanto mulherezinhas o fizeram. É preciso humildade, não orgulho.

Tudo isso dá nojo.

Não palavras. Um gesto. Não escreverei mais."


Em 27 de agosto ele se mata, ingerindo barbitúricos num quarto de hotel, em Turim.

Os motivos que levaram Cesare Pavese a esse trágico final podem ser inúmeros, mas serão, sempre, suposições. O certo - como em todos os suicídios - é a vivência de uma situação limite, um estado para além do qual a possibilidade de continuar a viver é algo inaceitável. No caso do escritor italiano, em 25 de março de 1950 ele descreve uma de suas prováveis razões:
"Ninguém se mata pelo amor de uma mulher. As pessoas se matam porque um amor, qualquer que seja, nos revela nossa nudez, miséria, inofensividade, nulidade.

in Digestivo Cultural

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