O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

terça-feira, maio 30, 2006

A MULHER NUMA "CULTURA" PATRIARCAL BÁRBARA


A DOLOROSA EXPERIÊNCIA DE UMA MENINA SOMALI



(...)
"Então ela pegou a faca - uma pequena faca, com um gancho na ponta. Puxou meu clitóris com mais força, e aí eu virei o rosto e disse para a outra mulher: "abrace-me forte", e cerrei os dentes. Então, meu Deus, Rahima, tudo aconteceu. Meu corpo foi cortado num segundo, do jeito que Fátima havia dito. Eu pude ouvir um shhhh...como o som de que quando se corta carne. Foi assim que cortaram o meu corpo. Ela cortou tudo - não os grandes lábios, mas cortou o meu clitóris e os dois pequenos lábios, que eram haram (impuros); tudo foi cortado como se se tratasse de um simples pedaço de carne. Minha nossa, Rahima! Eu pensei que fosse morrer. Abri os olhos e olhei para baixo, e o sangue estava jorrando. Uma parte de onde ela havia retirado a carne sangrava muito, e a outra parte estava branca.
Rahima, meu Deus, aquilo era só o começo. Perguntei se havia terminado, e ela disse que não, que iria fazer de novo, e disse outra vez: "só vai levar um minuto", e eu acreditei.

E todos que assistiam jogavam ouro e dinheiro sobre mim - nas minhas pernas, na cabeça - e cantavam.
Toda vez que eu queria chorar, olhava em volta para ver se alguém me ajudaria, mas só via sorrisos, então ficava constrangida, abria a boca e fingia rir, mas por dentro estava morrendo.
Ela cortou as bordas dos grandes lábios, e depois, com espinhos parecidos com agulhas, costurou sobre a vagina para fechá-las. Colocou sete espinhos, e cada vez que colocava um, ela o apertava com um fio. Ao terminar, colocou uma pasta negra para cessar o sangramento e apressar a cicatrização, e depois gema de ovo para refrescar. Embrulharam as minhas pernas com um pedaço de pano, do tornozelo aos quadrís, vestiram-me novamente e me carregaram para um quarto que tinham preparado para nós. O mesmo foi feito com as outras garotas.

Eu fiquei doente e tive febre. E quando urinava, parecia que ia morrer. Queimava como fogo, como álcool derramado sobre um ferimento aberto. A urina era quente, e eu gritava de dor. Elas tiveram de me cobrir; meus dentes batiam e meu corpo todo tremia quando minha mãe chegou.

...Os espinhos ficaram em mim por três dias, quando a mulher que fez a circuncisão voltou para retirá-los. Todo esse tempo as suas pernas ficam amarradas, mesmo quando vc urina. Você não toma muito líquido para não precisar urinar muito. Também não come quase nada, para não precisar fazer cocô; elas lhes dão apenas sopa de legumes e pão seco, porque querem que seu corpo fique seco rapidamente. Quanto mais líquido você bebe, mais faz xixi e mais o lugar da operação fica molhado, e elas querem evitar isso. Toda vez que você faz xixi arde muito, então elas jogam água morna com sal sobre os genitais enquanto você está fazendo xixi. O sal é desinfetante, e a água morna ameniza a dor. Depois que vc faz xixi, elas secam a ferida e levam você lá pra fora. Lá fora no daash, elas cavam um buraco no chão e enchem de carvão incandescente coberto com cinzas. Colocam incenso sobre ele e fazem você sentar sobre o buraco, apoiada numa mulher sentada num banquinho. A fumaça com o incenso faz você cheirar bem, e o calor faz o ferimento secar. Depos de fazer isso por três dias, de manhã, á tarde e todas as vezes que fizer xixi, você fica curada.
(…)
Eu fiquei boa em sete dias, mas uma das meninas que foi circuncidada comigo - aquela que tinha quase a minha idade - teve de fazer tudo de novo, pois quando fez xixi pela primeira vez sentiu muita dor, e não fez mais xixi por três dias. Aí, quando a mulher veio para tirar os pontos, ela fez cocô e xixi tudo ao mesmo tempo, e isso fez o buraco abrir todo. Fátima teve de dar pontos de novo - a menina sofreu mais e teve de ficar em casa quase um mês.
O motivo de ás vezes se precisar dar aquele ponto extra é que, quando você se casa, seu marido pode saber se você é virgem. Se ele vir que você tem um buraco um pouco maior, vai pensar que você andou aprontando. Assim, as mulheres - sua mãe e as mulheres que fazem a circuncisão - têm de garantir que o seu buraco tenha o tamanho certo. É por isso que dão todos aqueles pontos e costuram tudo.

...Uma menina costurada não vai se divertir por aí, pois tem medo da dor e de que a família descubra quando a examinar - o que é feito todas as semanas.

(…)
Vocês sabem o que é fístula?
As meninas são prometidas em casamento muito cedo nestes países da África e logo concebem e ficam grávidas. Mas como são meninas, seus corpinhos ainda não estão preparados para levar a termo a gravidez. Na hora do parto, o corpo não consegue expulsar a criança e aí é que o horror acontece. Vi relatos de meninas que foram penduradas em árvores para que a criança saísse, teve uma que ficou 7 dias pendurada na árvore até que a criança nascesse!!! Algumas vezes, tanto a mãe quanto o bebê morrem.
A fístula é uma seqüela que muitas delas adquirem com o parto forçado: a vagina se rompe e a mulher passa a urinar e defecar sem controlo algum. Quando isso ocorre, elas são abandonadas pelo marido e/ou trancafiadas em cubículos escuros, porque o mal cheiro é insuportável.
Quanto relatos como esse e outros, nós mulheres do ocidente precisaremos saber para que nos unamos e lutemos pelos direitos de todas as mulheres do mundo?



(enviado por email)





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