O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

quarta-feira, agosto 12, 2015

A mulher é o construtor primordial, o verdadeiro Primeiro Motor.




"É correcta a identificação mitológica entre a mulher e a natureza.
O contributo masculino para a procriação é fugaz e momentâneo.
A concepção resume-se a um ponto diminuto no tempo, apenas mais um dos nossos fálicos picos de acção, após o qual o macho, tornado inútil, se afasta.
A mulher grávida é demonicamente (diamon), diabolicamente completa.
Como entidade ontológica, ela não precisa de nada nem de ninguém.
Eu defendo que a mulher grávida, que vive durante nove meses absorta na sua própria criação, representa o modelo de todo o solipsismo, e que a atribuição do narcisismo às mulheres é outro mito verdadeiro.
A aliança masculina e o patriarcado foram os recursos a que o homem teve de deitar a mão a fim de lidar com o que sentia ser o terrível poder da mulher.
O corpo feminino é um labirinto no qual o homem se perde.
É um jardim murado, o hortus conclusus do pensamento medieval, no qual a natureza exerce a demónica feitiçaria.
A mulher é o construtor primordial, o verdadeiro Primeiro Motor.
Converte um jacto de matéria expelida na teia expansível de um ser sensível, que flutua unido ao serpentino cordão umbilical, essa trela com que ela prende o homem."

E AINDA...

“Os ciclos da natureza são os ciclos da mulher. A feminidade biológica é uma sequência de retornos circulares, que começa e acaba no mesmo ponto. A centralidade da mulher confere-lhe uma identidade estável. Ela não tem que tornar-se, basta-lhe ser. A sua centralidade é um grande obstáculo para o homem, cuja busca de identidade é bloqueada pela mulher. Ele tem que se transformar num ser independente, isto é, libertar-se da mulher. Se o não fizer acabará simplesmente por cair em direcção a ela. A união com a mãe é o canto da sereia que assombra constantemente a nossa imaginação. Onde existiu inicialmente felicidade agora existe uma luta. As recordações da vida anterior à traumática separação do nascimento podem estar na origem das fantasias arcádicas acerca de uma idade de ouro perdida. A ideia ocidental da história como movimento propulsor em direcção ao futuro, um desígnio progressivo ou providencial que atinge o seu apogeu na revelação de um Segundo Advento, é uma formulação masculina. Não creio que alguma mulher pudesse ter concebido tal ideia, já que a mesma é uma estratégia de evasão em relação à própria natureza cíclica da mulher, na qual o homem teme ser aprisionado. A história evolutiva ou apocalíptica é uma espécie de lista de desejos masculinos que desemboca num final feliz, num fálico cume”*


**In, Personas Sexuais
Camille Paglia

(ladrão que rouba a ladrão - tem cem anos de perdão...)

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